quinta-feira, setembro 20, 2007

Babel Brasília

oooO Pentateuco, que do grego significa os cinco rolos, constituí os cinco primeiros livros da bíblia cristã, cuja autoria é atribuída ao profeta israelita Moisés. O primeiro deles, Gênesis, tem por significado – origem, nascimento – dado pela Septuaginta. Nome da tradução da Torá (escrituras hebraicas) para o grego, do século III a.C., a pedido do rei do Egito Ptolomeu II (287-247 a.C.) para a Biblioteca de Alexandria, logo após sua recém inauguração, na cidade egípcia que lhe emprestara o nome. Já para o hebraico é Bereshit – no princípio, no início – que, por tradição ocidental, é também chamado de Gênesis. Trata-se, basicamente, do mesmo texto, porém com algumas diferenças no tocante à interpretações religiosas pelas diversas religiões que o aceitam.
oooAcredita-se que a abordagem do livro está relacionada a tudo que ocorreu antes do nascimento de Moisés. A narrativa, de visão judaica, descreve os fatos ocorridos desde a criação do mundo até a fixação dos hebreus [antigo povo que dera origem aos judeus], no Egito. Na bíblica do Antigo Testamento, o capítulo Gênesis apresenta:

“Toda terra era uma única língua e palavras únicas. Vindo do Oriente em seu peregrinar, encontraram uma planície na terra de Sinear (na região de Babilônia), onde se estabeleceram. E disseram cada um ao companheiro: – Vem! Fabriquemos tijolos e vamos cozê-los ao fogo. E ficaram com tijolo em vez de pedra e betume em vez de argamassa. Em seguida disseram: – Vamos edificar para nós uma cidade e uma torre, cuja cabeça penetre nos céus. E façamos para nós um nome para que não sejamos dispersos sobre a face de toda a terra.”

oooOrigina-se daí a Torre de Babel, construída pelas mãos dos descendentes de Noé. Pelos – filhos da humanidade – que faziam uso da mesma linguagem. O forte objetivo era chegar até Deus. E daí constroem a cidade e sua torre. Essa obstinada decisão – soberba – de fazer uma torre tão alta que pudesse alcançar o céu provoca em Deus algo que não contavam – sua ira. E Dele vem o castigo – confundir as línguas e espalha-los por toda a Terra.
oooEntende-se hoje que este “mito” ou esta “história” aponta para a tentativa dos povos antigos de explicarem os diversos idiomas, mesmo sabendo que existem, no sul da região da antiga Mesopotâmia, ruínas de torres que se ajustam perfeitamente à descrição da Torre de Babel qual registra a Bíblia.
oooHouve um dia em que o homem fez uma torre. Deus não gostou e confundiu a língua dos homens. Virou Babel, alguém disse. E, no Brasil, houve um dia que Brasília virou Babel.
oooVivemos um momento onde os políticos não fazem outra coisa a não ser CPI ou CPMI.
oooOcupados em tempo integral do reduzido tempo efetivo de trabalho para o cargo ocupado.
oooOcupados em defesas e acusações! Será essa a atribuição de deputados, senadores, governadores, ministros, secretários, procurador-gerais de justiça e de estado entre outros!
oooO deputado federal é o representante do povo, na integração da sociedade; os senadores têm funções legislativas, julgadoras, fiscalizadoras, são representantes constitucionais dos estados; dentre as atribuições do governador de estado temos a de sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; quanto às atribuições do presidente da república pode-se destacar a de exercer, com o auxílio dos ministros de estado, a direção superior da administração federal.
oooTudo isso – sempre – para a nação, para o povo.
oooNão estão cuidando disso, e sim de: um acusar o outro, o outro acusar o um, um se defende do outro, o outro se defende do um.
oooE, já que não estão cumprindo com o que as funções determinam, acho que deveriam ir para casa. O país assim economizaria a “fábula de dinheiro” que é gasta com eles.


oooHouve um dia que Brasília virou Babel ou Brasília é Babel – nossa Babel Brasília.

oooSe na Torre de Babel o castigo dado por Deus foi a mistura das línguas, desta vez já não cabe o mesmo castigo pois, já não falam a mesma língua. Esperamos ansiosos pelo providencial castigo, mas não fazemos nenhuma questão que deixem a exemplo da Torre, vestígios.

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Mauro Carreiro Nolasco
AGOSTO 2007

A arte em seu fim

oooSerá “O fim da arte” o fim das “obras de artes”? – o fim de: pinturas, gravuras, esculturas, da música, da literatura?
oooHistoriadores da arte defendem a idéia de que a evolução da arte está ligada a sucessivas e contínuas transformações – naturais, formais e até não formais – responsáveis por sua história, desde as manifestações rupestres.
oooNos últimos quarenta anos, pelo menos, a arte escreve sua história com independência, com sua própria maneira de ser, seu caráter – livre e sempre reflexiva. O que pode ser entendido como uma nova relação entre “arte” e “mundo”, o que não implica ser seu limite final.
oooA arte sempre provocou forte dedicação dos filósofos em 'tentativas' de “entendê-la” ou “explicá-la”. O conceito de arte para Platão (427-348 a.C.) era a da obra executada segundo o modelo presente na mente do seu executor, o artista. Uma mera imitação.
oooO sucessor de Platão, Aristóteles (284-322 a.C.) em suas reflexões faz distinção entre – a ação e o fazer da arte. A ação está relacionada com quem produz arte, enquanto que a arte é o resultado dessa ação. Um fazer.
oooO neo-platônico Plotino (205-270) reformula Platão e defende que a arte não apenas imita o que o artista vê, e sim que ela aponta para as razões de origem do objeto natural. Um olhar para as idéias universais que transcendem a natureza.
oooA filosofia do período medieval retoma Platão, Aristóteles e Plotino. Um 'fazer coisas', orientado por um modelo, em nova visão. Esse 'fazer coisas' é acrescido de algo místico, que faz dessa arte medieval, denominada de Gótico, um fazer a partir da vontade do artista. O artista passou a mostrar o que pensava e o que sentia. A partir daí a arte passou, cada vez mais, a ser observada e entendida pelo que é intencional e, cada vez menos, como um fazer coisas. Até esse ponto da história da arte, a arte que era entendida por – fazer unicamente coisas e fazer coisas que revelam temas – passa a ser somente o – fazer coisas que revelam temas.
oooE entramos numa nova discussão: o belo e a arte.
oooO “pai da filosofia moderna” René Descartes (1596-1648) dedicou-se a direcionar o estudo da filosofia para uma nova direção, numa recusa aos pensamentos dominantes da época, o que provocou uma revolução no estudo da filosofia. O francês, filho de nobres, Descartes, tentou direcionar o estudo da filosofia para uma nova direção, recusando-se a aceitar os pensamentos que predominavam na época [filosofia denominada pelo método escolástico que se baseava em: comparar e contrastar visões reconhecidas pela Igreja]. Só acreditava no que conseguia provar sua verdade. Para se chegar à verdade era necessário partir do zero [até mesmo sobre a própria existência]. Respostas baseadas não na fé, e sim na suspeita. Desse modo de ver conclui “Penso, logo existo” (no latim - Cogito, ergo sum).
oooE o que tem Descartes a ver com a arte?
oooSua influência no “alargamento” da filosofia repercutiu nos estudos das ciências, da matemática, física, fisiologia, da justiça, da teologia e ainda provocou bons resultados no pensamento europeu. Influenciou inúmeros filósofos posteriores a ele. Suas idéias filosóficas estiveram sempre presentes nos séculos 17 e 18. Filósofos como Baumgarten e Kant, que dedicaram também seus estudos a arte, utilizaram suas teorias e princípios.
oooPara o alemão Alexandre Baumgarten (1714-1762) afirmou: o belo é uma propriedade da sensibilidade perfeita, como a verdade o é do pensamento.
oooEssa reformulação levou então à arte uma nova responsabilidade: criar a beleza sensível. A partir dessa conjugação é que decorreu a Estética, do grego aísthesis (sensação) – temos então a filosofia da arte.
oooO grande filósofo da modernidade, Immanuel Kant (1724-1804) marcou um segundo momento na filosofia moderna, ainda que com forte influência dos que o antecederam, ele desenvolveu uma nova Estética. Sua filosofia moral afirma que a base para toda razão moral é a capacidade do homem de agir racionalmente. É crença para Kant que: toda pessoa deve comporta-se de forma igual a que ela espera que qualquer pessoa se comporte, para uma mesma situação. Descrevendo assim que esse comportamento passaria a tornar-se uma lei universal. O fazer coisas belas, como a arte, assume agora, novas direções, sobretudo, cresce no tocante à expressão. Para Kant o belo representa o arquétipo da espécie que retrata o seu próprio juízo.

oooContinuaremos nessa análise no próximo artigo.

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Mauro Carreiro Nolasco
JULHO 2007

quarta-feira, setembro 19, 2007

Das Sete Maravilhas

oooA polêmica se instalou em jornais, revistas e outros meios de comunicação, enfocando a pesquisa sobre a eleição do Cristo Redentor como uma das maravilhas do mundo moderno.
oooO projeto de construção é da engenharia brasileira, que teve, como partida, desenhos do pintor Carlos Oswaldo e participação popular, carioca, na escolha do Cristo – de braços abertos. A edificação levou cinco anos. Sua realização iniciou-se em 1926. A idéia da homenagem ao Cristo com uma estátua é de 1921, quando então se organizou a campanha “Semana do Monumento”, com a intenção de conseguir fundos para sua viabilização, direcionada principalmente aos católicos.
oooNa primavera de 1931, às 19 horas e 15 minutos do dia 12 de outubro, a estátua do Cristo Redentor foi inaugurada, a 709 metros de altitude, com suas 1.145 toneladas, medindo 30 metros, mais a base de 8 metros, onde há uma capela. Corpo e braços – obra da engenharia de Heitor da Silva Costa (1873-1945), cabeça e mãos – obra da escultura do francês Paul Landowski (1875-1961).
oooSe o Cristo Redentor fosse planejado hoje, sobre o mesmo Corcovado, certamente a instalação da bela escultura seria questionada pelos órgãos de preservação ambiental. O impacto na paisagem, o necessário desmatamento para criar o acesso e a linha férrea seriam certamente entraves para a criação desse produto turístico monumental.
oooSem dúvida, o Corcovado e o Bondinho do Pão de Açúcar são os agentes publicitários mais fortes do Rio de Janeiro e produzem marketing que alcança todo o mundo. São marcas da cidade.
oooIncluir o Cristo como conjunto natureza / arte, ou só a estátua como monumento não faria diferença no ranking mundial de maravilhas, mas o todo é que é digno de nota: o recorte do verde no azul do céu sobre o granito de forma caprichosa já é maravilhoso, aliás, como todo o relevo desta cidade – linda e violenta.
oooSó o monumento, fora da “Acrópolis” em que se aninha, já seria uma bela escultura art déco digna de um museu, fosse a céu aberto ou mesmo confinada em uma nobre sala, como as do Louvre ou do Museu Britânico. Nesse caso, seria mais uma obra de arte fantástica do início do século XX, juntamente a outras que jazem nesses museus “maravilhas” como o Parthenon, cujos frisos se encontram no Museu Britânico, ou da Vênus de Milo, hoje no Louvre, e as remanescentes estátuas gigantes do antigo Egito, hoje espalhadas por várias salas de exibição.
oooO harmonioso conjunto do Corcovado não poderia ser rotulado apenas como uma das sete maravilhas contemporâneas, mas a perfeita integração da natureza com a capacidade humana de transformar matéria bruta em algo emocionante e tão bem proporcionado, apesar da monumentalidade que nos tira o fôlego, pela harmonia do conjunto.
oooNesse conjunto, a obra ultrapassa o autor e quase ninguém se lembra ou sabe quem a executou ou ainda a irmandade entre França e Brasil ali estabelecida, o país que já tinha sido aqui invasor, no século XVI, mas que, quase quatrocentos anos depois, coloca no ápice da cidade, através dessa obra de arte, a grandiosidade da criação divina e o fervor religioso que sempre caracterizou o povo brasileiro.
oooArte, política e religião estão expressas maravilhosamente e irmanadas no Cristo Redentor e no espírito globalizado da cultura e da beleza.
oooSete: sempre este número.
oooPor que não juntar sete mais sete a outras maravilhas menos nomeadas e aproveitar para rotular o planeta terra como uma das maravilhas do universo? E tentar preservá-lo!




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Mauro Carreiro Nolasco
JUNHO 2007

Maria Domícia

oooLamentei a morte de uma mulher que sequer conheci, mas que me despertou curiosidade, pelas histórias contadas por um amigo a seu respeito. Por uma dessas que só o destino pode 'aprontar', fui eu a dar a noticia de seu falecimento a esse amigo – João Carlos de Figueiredo. Ele, sempre de olhar atento às coisas de São Gonçalo, da arte e da cultura, declara – não li nenhuma nota nos jornais de Niterói e de São Gonçalo.
oooJoão Carlos, admirador de Maria Domícia dos Santos e de sua voz, lembra-se das apresentações, nas missas do Externato Santa Terezinha do Menino Jesus, sempre repletas de pessoas, e nos casamentos na Igreja Matriz de São Gonçalo.
oooA formação de Domicia teve início na Escola Nacional de Música, que passou a se chamar Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro desde 1965, e culminou em Niterói, com a professora Maria Elizabeth Esberad.
oooApós alguns segundos de saudosas lembranças João Carlos me diz: – Voz é um dom e uma dádiva, e, aparecem de vez em quando excelentes, mas o seu apuro, desenvolvimento, conhecimento da arte que tem pela frente, dependem da interação aluno-professor. Senão pode-se chegar a resultados desastrosos: vozes belíssimas são desperdiçadas e mal conduzidas, não chegando a lugar nenhum e perdendo toda sua espontaneidade com os absurdos, como – coloca a voz aqui, respira aqui, até chegar a lugar nenhum, perdendo a naturalidade de sua emissão, respiração etc..
oooA voz privilegiada de Domícia tinha tudo para torná-la uma destacada cantora lírica – opinião de algumas pessoas que a conheceram e que assim atestam. Sua voz era capaz de 'percorrer' do soprano ao contralto – era uma Mezzo-soprano virtuosa. Cantora lírica sem nada a dever à francesa Lily Pons (1898-1976), Soprano leggero – o timbre feminino mais leve dos sopranos; ou à norte-americana Maran Anderson (1897-1993), também da raça negra, como Domícia, Contralto – o timbre feminino mais pesado, robusto e vigoroso; ou da mais conhecida entre os brasileiros não iniciados na música lírica, a também norte-americana, Maria Callas (1923-1977) – uma das mais importantes Soprano, com sua voz poderosa pela beleza do timbre, de amplitude incomum, e que, pelo perfeito domínio das técnicas do canto, percorria desde o mezzo-soprano até o soprano coloratura.
oooEm minha curiosidade, “catuco” a memória de João Carlos por mais histórias, que me conta: – Ouvir Domícia era guardar a marca de uma grande voz. Tive oportunidade de ouvi-la, em muitos dos seus melhores momentos. E a lembrança me vem da casa do amigo Arísio, quando nos reuníamos para ouvir música e, Domícia ali desfilava árias, canções populares internacionais e até imitava Louis Armstrong...
oooE ele conta mais sobre o recital de Domícia pela criação da Associação Artística de São Gonçalo, num galpão do Colégio São Gonçalo; a interpretação em Esperanto; a participação na “Barca da Cultura”, organizada por Paschoal Carlos Magno. E ainda recorda ter levado uma gravação caseira, feita por ele próprio, ao Flávio Cavalcanti, que após ouvir comenta: – Yma Sumac, cantando em português... como é possível – e reage sem entender como essa cantora peruana poderia interpretar tão bem “Pergunte aos Canaviais” de Lourenço da Fonseca Barbosa, o Capiba. Esclarecida a 'brincadeira', Flávio Cavalcanti quer conhecer Maria Domícia, o que acontece alguns dias depois, em seu apartamento. E ela canta ao vivo para ele que, após ouvir atentamente comenta: – Há uma razão para essa voz, pois seu nome carrega o som de três notas – o do o mi e o si – Do-mi-ci-a.
oooA carreira de um artista aqui no Brasil nunca foi fácil e ainda mais para uma negra no canto lírico. No caso de Maria Domícia, apesar de não seguir uma carreira de brilho, para a qual valor não lhe faltava, conseguiu unanimidade de conceito. João Carlos diz: – ela é, para São Gonçalo um vulto que merece ser cultuado e reverenciado.
oooA Academia Gonçalense de Letras e Artes já a integrou no quadro de membros acadêmicos, mas homenagens lhe faltam ainda, pois sempre permaneceu com suas raízes e com sua arte.
oooApós essa conversa com o amigo João Carlos, acho que descobri o porquê de meu interesse por essa mulher: é que na minha infância, em minha casa, não perdíamos o Programa Flávio Cavalcanti – minha memória não me traz a lembrança dela mas o registro é que, segundo os estudiosos, não se perde.
oooMaria Callas disse uma vez – "Se você ama a música, a ponto de servi-la humildemente, o sucesso acontecerá automaticamente.”. Pena que não ocorreu aqui com a nossa Maria – Maria Domícia.

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Mauro Carreiro Nolasco
MAIO 2007